– Nos últimos dias, o Brasil obrigou Portugal a parar. Ninguém negará que terão sido poucos aqueles que, por cá, não vibraram com o duplo sucesso do Mengão.
Comparo este entusiasmo, eufórico e desmedido, àquele que sentimos quando a seleção portuguesa oferece-nos momentos únicos de alegria e magia.
Esse sentimento de identidade nacional, de puro patriotismo, é qualquer coisa de fantástico. É como se a nossa auto-estima coletiva precisasse de injeções assim. Potentes. É como se implorasse que alguém que nos devolvesse o amor próprio e nos fizesse sentir gigantes perante o mundo que um dia foi (quase todo) nosso.
Da minha parte, confesso que senti um orgulho tremendo no trabalho de Jorge Jesus e sus muchachos. O homem é raro, distinto e já escreveu a história que ficará na História. Quantos se podem gabar disso? O que ele conseguiu, num país que usa os tugas como anedota de bolso e chacota de algibeira, é qualquer coisa de mágico. Sublime até. Chapeau.
Esta nossa capacidade – a de insuflarmos a auto-estima com feitos dos nossos, além-fronteiras – é tão deliciosa quanto bipolar: é que, há não muitos meses, muitos dos que agoram destilam idolatria pelas televisões e redes sociais, passavam parte do seu tempo a diminui-lo, achincalha-lo e a chamá-lo de burro, analfabeto e traidor.
O futebol é qualquer coisa de espantoso, não é?
Certo, certo é que se os golos não tivessem aparecido a partir do minuto 88 (e se o Grémio, entretanto, não tivesse triunfado sobre o Palmeiras), havia muita, mas mesmo muita gente, neste exato momento, a pôr em causa a sabedoria, qualidade e competência do Mister.
É que, neste mundinho estranho, a meritocracia marca poucos pontos. O que conta é o número de vezes que a bola entra na baliza do adversário. O que conta são as vitórias e os pontos somados… e esses duram o que duram. Tal como a qualidade de gente como Jesus.
É um universo duro, difícil, por vezes conflituoso e que, aqui e ali, parece ser alicerçado numa sede insaciável de poder e ganância. Não há muito a fazer quanto a isso. Apenas esperar que os muitos sapiens que ainda existem, com coluna e caráter no sítio, possam transformar o futebol naquilo que verdadeiramente tem potencial para ser: um espetáculo espantoso, uma indústria imparável, uma verdadeira escola de valores.
– Isto faz-me lembrar uma notícia recente (felizmente isolada e pouco exponenciada pelos media) sobre alegada viciação de resultados na classificação dos árbitros.
Não é de admirar que comecem a surgir pérolas destas. As eleições são daqui a meia dúzia de meses e está na hora dos gulosos começarem a movimentar-se, a plantar discórdia aqui e ali. É a luta titânica dos pequeninos em busca de um lugar ao sol. É o estrabuchar dos infelizes. O esbracejar dos nulos. Faz parte, mas não deve demover quem está no seu lugar de continuar a trabalhar como pode e sabe. O resto… são peaners.
– Esta nova pausa nos jogos da LIGA NOS, ainda que bem explicada e justificada, não deixa de ser, aos olhos da perceção pública, do adepto comum, qualquer coisa de escabroso. Não faz sentido e não se vê noutras paragens, onde se joga futebol a sério. Serei só eu a pensar assim?
Artigo publicado no Jornal “A Bola”