Olhos nos olhos
Devem os árbitros assumir (ou não esconder) o clube da sua simpatia?
A esta pergunta, a experiência diz-me que… não.
Infelizmente, não. E não porquê?
Porque culturalmente as pessoas não estão preparadas para ouvir essa verdade. Não sem levantarem suspeitas sobre a idoneidade ou honestidade de quem faz essa escolha.
Sabem porque é que eu sei?
Porque decidi ser sincero logo aos 18 anos, quando me inscrevi no curso de arbitragem.
Logo aí cheguei à conclusão que, por cá, essa é uma verdade a omitir, porque serve de mote às piores teorias de conspiração que se pode criar.
A única grande vantagem foi a de ficar em paz com a consciência. A de dizer a verdade. A de ser intelectualmente honesto.
De resto, só desvantagens.
Muitas pessoas – quase todas – ainda acham que os árbitros são os únicos agentes desportivos que condicionam a verdade em função das suas preferências. Que o fazem de propósito. Com maldade.
Essas pessoas são as mesmas que acham normal que o melhor jogador da sua equipa seja adepto do grande rival.
São as mesmas que aceitam que o seu treinador seja sócio pagante da equipa concorrente.
São as mesmas que sabem que na estrutura do seu clube há vários profissionais que são simpatizantes de outros clubes, alguns onde até já desempenharam funções desportivas.
O profissionalismo e a seriedade desses jamais é posto em causa. E bem.
Mas quando toca ao árbitro, a coisa muda de figura: a memória seletiva é logo infetada por um vírus que, regra geral, se manifesta de duas formas:
– Quando erra a favor… é porque é desonesto e toda a gente sabia ao que vinha.
– Quando erra contra… é porque quis mostrar que era tão sério que o seu subconsciente fez com que, na dúvida, decidisse para o outro lado.
Haja paciência para tanta pequenez de espírito. A verdade?
A verdade é que quem vai para árbitro adora futebol e já era gente bem antes de seguir esse caminho.
A verdade é que a maioria das pessoas são simpatizantes de um algum clube e isso aplica-se a árbitros, jogadores, treinadores, dirigentes, roupeiros, massagistas, diretores desportivos, comentadores ou jornalistas.
A verdade é que este é um mundo hipócrita, que exige tecnologia de ponta mas que prefere a mentira à honestidade.
E enquanto assim for, enquanto a cabecinha for fraca porque a suspeição é maior, aconselho os árbitros no ativo a escolherem a via da omissão.
Não digam nada. Eles não entendem nem aceitam.
Em primeiro lugar Duarte Gomes, tem aqui um admirador. Não sei de que Clube é, nem me interessa enquanto ler as suas análises, for aprendendo, e conseguir discernir em si distanciamento face aos vários Clubes. Quanto ao texto, acho-o sonso, lamento. Nem todos os árbitros estão no futebol porque adoram o desporto. E aí concedo-lhe a semelhança com outras profissões. Nem todos os mecânicos adoram a água que corre no cano. Nem todos os marceneiros vivem fascinados com pinho. É sonso olhar à sua volta, e não perceber que alguns árbitros (muitos), não se limitam a simpatizar com um Clube. Escrevem publicamente em redes sociais alarvidades sobre os outros clubes, e sobre dirigentes. A decisão de ser árbitro não corresponde a “nascer” como diz, mas devia corresponder a uma nova vida. As recompensas de ser árbitro vêm acompanhadas de deveres, que correspondem a um estatuto novo, de figura pública (e que tem muitas coisas positivas, como por exemplo, olhe, ser hoje comentador de TV, recompensas financeiras, sociais, etc.). As pessoas interrogam-se relativamente a essas preferências clubísticas quando pressentem uma diferença de tratamento, de critério. E depois quando são confrontadas com comunicações que infelizmente alguns dos seus ex-colegas, continuam a ter. Quando falamos de apitos dourados, emails, etc… é preciso não esquecer que não são apenas dirigentes (que nós adeptos também questionamos, não são apenas árbitros) que ali são apanhados. São árbitros também. A sua classe tem muitos telhados de vidro para um discurso tão enérgico como o que o seu mail sugere.
Há algum tempo que defendo que os árbitros deviam dizer o clube que apoiam, criando assim uma maior transparência e menos especulação. Mas lendo este texto relembra-me o que já achava ser dificil, a aceitação por parte do publico. A verdade é que parece-me neste momento que dificilmente algum dia essa aceitação chegará e é utópico pensar que o estigma em torno dos profissionais da arbitragem irá desaparecer. Demasiados interesses. Podem funcionar como bodes expiatórios, como desculpa para maus resultados, como vilões para unir jogadores e adeptos num só, os erros vendem jornais, dão audiências e os insultos e calúnias animam e rejubilam os adeptos. O Duarte Gomes está a fazer um excelente trabalho no sentido de mostrar tanto o lado humano da arbitragem como a parte técnica que tantos arbitros de bancada fingem conhecer. Ainda há muito trabalho pela frente, mas penso que estamos a melhorar muito graças ao seu trabalho.
A solução parece-me simples, até olhando ao que escreveste. Castigos pesados para quem fala de arbitragens como em Inglaterra. E lá também há erros grosseiros nos jogos, acontece a todos. Mas o ambiente de suspeição foi se eliminando do público, não tendo os dirigente a falar do assunto. Depois as pessoas habituam-se a isso e começam a falar mais de futebol e menos do circo que se faz a volta. Adoro ver a liga inglesa e nos programas desportivos aprende-se muito de futebol.
Sim, claro. Os dirigentes são os principais culpados, e sobretudo também a comunicação social. Mas até duvido que a Liga tenha esse interesse em diminuir isso. Por vezes parece que todos beneficiam com este clima menos os profissionais e o próprio desporto.
Sim, és capaz de ter razão, as vezes dá a ideia que é mesmo isso que querem. Até pode ser um bom caminho para chamar pessoas a curto prazo, mas a longo prazo as pessoas vão se fartar (como eu já me fartei) e vão por o futebol de parte. A liga Inglesa é um exemplo de sucesso desportivo e financeiro. Claro que não é o caminho mais fácil, mas comprovadamente é o melhor.
Duarte Gomes, acho que é bem mais simples que isso, as pessoas levantam a suspeição sobres os árbitros por serem do clube X ou Y porque elas próprias são tendenciosas. Eu não consigo entender como é que as pessoas acham que um profissional, neste caso o arbitro, ia colocar a sua carreira em causa por uma preferência clubistica. É surreal… Mas não me admira que essas pessoas que acham isso o fizessem. Ai se calhar é que está o problema, a meu ver, quem acha que um arbitro não vai ser isento na sua profissão por causa da sua preferência clubistica é porque se calhar era capaz de, no lugar dele, não ser isento. Eu não sou anjinho e sei que também haverá pressões e possivelmente coisas piores, mas isso é como em todas as profissões. Quanto a questão, concordo consigo, no ambiente que temos atualmente é preferível não dizer.
Boa tarde, gostaria de fazer uma questão pertinente que me faz alguma confusão, o porque de um arbitro nunca poder vir a publico “limpar” a sua imagem? Fazem conferencias de imprensa antes das finais da Taça da Liga e de Portugal, mas depois nunca se ouve os árbitros. Acho que seria importante depois do jogo saber o que levou um arbitro ter assinalado penalti ou não o ter marcado, ou outro caso qualquer importante para o jogo. Ainda por cima agora com o VAR que é bastante mais fácil explicar a decisão. Na minha opinião a arbitragem precisa também de se mostrar importante. Aproveito para parabenizar o site e as suas questões. Cumprimentos.
É um assunto bem complexo, como diz. Porém, mesmo que não o digam, haverá sempre alguém que lhes aponte um clube. O que se me afigura intrigante é que venha alguém, dirigente de um clube ou até diretor de comunicação desse clube, “acusar” árbitros de serem deste ou daquele clube, impunemente, e está bem de ver tendo em vista condicioná-los e também a quem os nomeia. Haja quem aja castigando exemplarmente esta gentinha.
Concordo com cada virgula deste texto!!!
Parabéns ao Duarte Gomes pelo trabalho que tem vindo a desempenhar!!!
Eu já não consigo ter conversas sérias com ninguém sobre futebol… Fala-se de tanta teoria da conspiração que até dá dó! Se a culpa é do adepto que tem a mente fraca e se deixa levar na onda!? Se calhar sim, mas porra… E os dirigentes? Não serão eles os mais interessados em que de 2ª a 6ª feira se tenha 6 ou 7 programas “desportivos” (deixei de ver porque de desportivos não têm nada) onde se faz de tudo menos falar de futebol? E porque continuam a existir tantos desses programas? Porque existem consumidores que os consomem e falam deles nos dias a seguir e lhes dão publicidade!! Os dirigentes têm interesse neste clima. São os principais interessados! Nenhum dirigente ama tanto o clube que representa como o adepto mais comum… Eles estão lá por interesse e para, em última análise, se servirem. NENHUM tem interesse na verdade desportiva mas TODOS são os primeiros a colocar o dedo na ferida quando um árbitro erra em seu desfavor… Quanto já ssumiram que ganharam com 1 erro que os benificiou!? Nenhum!!! Enfim. Não é só no futebol. Estende-se por todos os sectores deste país. Toda a gente se serve e são raros aqueles que estão para servir o bem comum, para serem honestos… Páis podre. Mundo podre. Ser humano podre…