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O TRABALHO DE UM EX-ÁRBITRO

O TRABALHO DE UM EX-ÁRBITRO

Esta quadra é habitualmente propícia a balanços e reformulação de objetivos e eu não quero fugir a essa regra. Por isso, permitam-me que partilhe algumas ideias relativas ao ano que está a terminar e ao que aí vem.

Como já referi repetidamente, comentar lances é a parte mais incómoda do meu trabalho. Nunca é fácil falar sobre os enganos dos árbitros, sabendo melhor do que ninguém as dificuldades e obstáculos que sentem, dentro e fora do campo. Costumo dizer com frequência que, em matéria de erro, tirei a licenciatura, mestrado e doutoramento. E essa é uma verdade que faço questão de nunca esquecer.

É que, tal como eles, sei que cada julgamento está tão perto do sucesso como do fracasso. Sei que, por muito que se trabalhe cá fora e se tente lá dentro, alguma coisa correrá mal, nem que seja o lançamento ao contrário, o amarelo por exibir ou a falta por assinalar. E, na verdade, a minha grande frustração é não ter tido ainda a capacidade de convencer as pessoas disso. Esse é o primeiro grande objetivo de 2018: tentar (continuar a) mostrar às pessoas que os erros não são fruto de atos premeditados, mas inerências do jogo. Inerências que podem e devem ser evitadas, mas que não devem nunca confundir-se com desonestidade, perseguição ou atropelo ostensivo à verdade desportiva.

O segundo objetivo é o de continuar a fazer mais, muito mais pela arbitragem. Porque essa coisa de falar de penáltis, vermelhos e foras de jogo pode até ser o ópio do povo mas não é mais do que uma parte menor daquilo que deve ser o trabalho de um ex-árbitro.

Por isso, quero continuar a dedicar tempo e atenção àquilo que é verdadeiramente importante: ir a clubes de futebol, a núcleos de árbitros e a escolas de vários ciclos; manter espaços de intervenção pública onde se discutam soluções e não problemas; participar em mais colóquios, palestras e ações de formação; falar mais de valores, respeito e ética e menos da falta deles; ajudar a defender a integridade e idoneidade dos árbitros, de todas as idades e de todos os escalões; lutar pelo policiamento e pela segurança física dos agentes mais expostos (jogadores, treinadores e árbitro); criar mais debate, promover mais iniciativas e ajudar a esclarecer, explicar e humanizar o trabalho de quem está em campo.

Há tanta coisa, boa e importante, para fazer pelo futebol e pela arbitragem. E é fundamental focar cada vez mais nisso e cada vez menos no resto.

Se está a ler isto e acha que não passa de puro lirismo, é porque na verdade nunca se entregou de corpo e alma a algo que verdadeiramente gostasse e acreditasse. Isso pode fazer de mim demasiado romântico… mas o que fará de si?

Prometo como não vou mudar o mundo. Vou só fazer a minha quota-parte e mudar a forma como me encaixo nele. Pode ser?

Feliz ano novo.

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