“Então mas foi ou não foi penálti? Era ou nao era vermelho? Ou sim ou sopas, caramba!”
Esta lógica, geralmente apregoada por quem nunca jogou futebol, existe há séculos. O povo, geralmente aquele que nunca sentiu o que é estar num relvado, tem esta exigência permanente: quer que cada jogada e cada lance, tenha uma só decisão. Uma que seja factual, final. Definitiva.
Esta sede de vereditos tem, geralmente, uma particularidade interessante: é mais evidente em jogos onde há muita coisa em disputa. Onde há mais mediatismo ou rivalidade.
Diz-me a experiência que, na verdade, as pessoas raramente querem uma opinião isenta. O que querem mesmo é ouvir uma que vá ao encontro da sua. Uma que lhe dê razão.
Vem isto a propósito do lance mais mediático da última jornada: o que ocorreu na Luz, entre Ricardo e Zivkovic.
É, temos pena… um dos tais. Um lance de talvez sim, talvez não. E se não confiam na palavra deste vosso cronista – dizem quando discordam, que nao cortei o cordão umbilical – perguntem a dez dos vossos amigos (racionais)… e verão o quanto eles se dividem na leitura desse instantâneo.
O jogo já lá vai e a decisão, boa ou má, também. Mas a história do jogo irá encarregar-se de repescar essa dúvida (enorme, reconheço), como se ela fosse o único momento de um clássico recheada de bons momentos e grandes pormenores.
Nao escondo que um eventual erro do árbitro pode influenciar jogos e decidir campeonatos. Mas dito assim, de forma tão sistemática, dá a sensação que o erro do jogador ou do treinador não. E nós, que pensamos sem obedecer às emoções, sabemos que os lapsos desses, tão normais e aceitáveis como o daqueles, também decidem.
Este momento transporta-nos para outro, curiosamente oposto, que importa aqui desmontar. O célebre “Os nossos árbitros apitam muito. Deviam deixar jogar como os ingleses!”.
A verdade não é bem essa. A verdade, digo que pelo que vejo, é que só quer esse “laissez faire, laissez passer” quem se sente beneficiado pela opção de não interromper uma jogada. Porque quando o lance é na área e potencialmente a favor da “nossa” equipa, qual deixa jogar qual quê:”Marca lá o penálti, pá! Não viste que o gajo empurrou o rapaz, meu ladrão? Quem tem medo compra um cão!!”
Digam lá… tenho ou não tenho razão?
Vendo tudo isto com outra distância e menos humor, a culpa não é do adepto em si, que olha para o jogo com os olhos do coração e com a voz tremida da emoção.
A culpa é de quem nunca o ensinou a entender verdadeiramente o jogo jogado no relvado. E este é o nosso papel. O meu papel. Por muito que o “nim” incomode ou que o “benefício da dúvida” irrite. Por muito que os carimbos fiquem na repartição de finanças mais próxima.
Concordem, discordem, gostem ou não… mas aprendam a respeitar esta perspetiva. Porque, acreditem, o futebol nao é uma ciência matemática.
Aos pouquinhos, quem sabe não nos tornamos tão fantásticos e competentes como aqueles que dirigem jogos em Inglaterra, mas que pasme-se… nem vão ao Mundial?
Foto: Jornal A Bola